CNBB PROMOVE PRIMEIRO ENCONTRO NACIONAL DE ASSESSORES JURÍDICOS DE DIOCESES, EM BRASÍLIA (DF)
Teve início na manhã desta terça-feira, 8 de novembro, o primeiro Encontro Nacional dos Assessores Jurídicos das Dioceses (ENAJD), promovido pela Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB). O evento conta com a participação de mais de 200 profissionais do Direito que atuam nas Igrejas particulares do país e segue até o dia 10 de novembro.
Na abertura das atividades, estiveram presentes o presidente do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Beto Simonetti, e a ministra do Supremo Tribunal Federal (STF) Cármen Lúcia Antunes Rocha, que proferiu a aula magna. De acordo com a organização do evento, são 203 advogados representantes de mais de 120 dioceses do Brasil.
No início do encontro, foi exibido o vídeo de saudação do arcebispo de Belo Horizonte (MG) e presidente da CNBB, dom Walmor Oliveira de Azevedo. Ele destacou que cada especialista no campo das leis “é protagonista na promoção da justiça, que é essencial à paz”.
“Por isso mesmo, todos que integram o campo jurídico devem investir sempre e cada vez mais no conhecimento das leis, da realidade social e, particularmente, do atual contexto eclesial”, afirmou dom Walmor.
Em sua fala, o bispo auxiliar do Rio de Janeiro (RJ) e secretário-geral da CNBB, dom Joel Portella Amado, recordou os desafios que batem às portas da Igreja no âmbito do Direito. Nesse contexto, “na medida em que o mundo caminha e as realidade se transformam, surgem questões para as quais as respostas com que estamos acostumados se mostram cada vez mais insuficientes”.
E destacou que a especificidade jurídica da Igreja não a exime de responder adequadamente às exigências juríficas da sociedade em que ela se encontra. “Não fosse por outro motivo, nós temos a nos cobrar o Evangelho por motivo do testemunho. Seria inócuo a gente, da parte da Igreja, cobrar, por exemplo, justiça, probidade, se ela mesma não desse testemunho deses valores”, salientou.
Dom Joel ainda destacou uma frase do Papa Francisco na qual ele descreve os profissionais do Direito como “anjos da guarda que Deus enviou”. Assim, ressaltou o próposito de continuar a contar com a solicitude dos profissionais e a intenção da Conferência em manter o contato com as assessorias e reuní-las “no enfrentamento das questões emergentes, gerando nesse ponto esse intercâmbio de compreensões e soluções”, num processo de aprendizado que irá contribuir para a igreja no Brasil.
O presidente da OAB, Beto Simonetti, disse ser uma “imensa honra” participar do primeiro Encontro Nacional de Assessores Jurídicos de Dioceses. “Oportunidade solene para a advocacia brasileira reunir grandes profissionais que estão na linha de frente da luta pela cidadania e pela justiça em nosso país”, descreveu.
Compromisso com o direito em benefício de todos
Em seu pronunciamento, a ministra Cármen Lúcia destacou sua relação de cinco décadas com a Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC-Minas), na qual é professora. Ali, ela pôde nutrir desde a sua formação o compromisso com o Direito em benefício de todos. E essa foi a base de sua reflexão apresentada aos advogados presentes, na relação do direito com a garantia dos direitos humanos e na promoção da humanização na sociedade.
Citando Carlos Drummond de Andrade, contextualizou o “tempo de partido, tempo de homens partidos” e a presença dessa reflexão no momento atual. “As leis não bastam, porque há perguntas inéditas na humanidade e o direito não tem respostas prontas. Esse é o desafio, mas também a possibilidade de nós recriarmos, reinventarmos como seres humanos”.
A ministra também citou o jurista Gerson de Britto Mello Boson, que em um de seus textos lamentava a negação do ser humano de sua essência, ao se desumanizar. “Hoje, eu sou juíza de um Brasil de muitas humanidades. E eu tenho uma constituição, uma ideia de justiça para fazer cumprir num Brasil de muitas humanidades, mas de muitas e terríveis desumanidades”, sublinhou.
Abordando a importância do Estado Democrático de Direito e a atuação da advocacia para a garantia do mesmo, Cármen Lúcia passou por momentos históricos na realidade jurídica brasileira até chegar ao processo constitucional da década de 1980. Ali foi pensado o direito constitucional “para garantir um pantamar de mínimo existencial para todas as pessoas e de chegar a um patamar civilizatório que a humanidade já tinha conseguido conquistar”.
A Constituição de 1988, então teve como princípio mais importante o da dignidade humana. Nesse sentido, há a compreensão de que o ser humano não é só matéria, mas também espírito, destacou. “A concretização desses princípios é obrigatória para todo mundo. E para as instituições da sociedade também”, disse.
E é nesse contexto que a ministra destacou a importância de garantir a liberdade de crença para o povo brasileiro. “A garantia da liberdade constitucional à inviolabilidade da crença é essencial para que nós tenhamos uma sociedade que não se desumanize. Nós temos que trabalhar no sentido de construir um direito cada vez mais humanizado e coerente com o que o ser humano precisa em sua integralidade”, afirmou.
Ao final de sua exposição, a ministra Cármen Lúcia citou Cecília Meireles para vislumbrar o futuro – “que tempos chegam depois de tão dura prova?”. E denunciou as desigualdades presentes no país:
“Só o corpo não basta, só riqueza material não basta. E a desigualdade que leva alguém a ter fome num país que tem terra, que tem chão, que tem sol, que tem água, é uma desumanidade da qual todos nós aqui somos cúmplices, somos corresponsáveis. É preciso saber que a humanidade só sobreviverá quando ela guarnecer e fizer frutificar o que melhor ela tem na sua alma. Por isso que eu continuo acreditando que nós precisamos da inviolabilidade da crença para fazer verdadeira em cada um de nós a fé que deseja professar”.
Fonte CNBB